domingo, 30 de agosto de 2009

Construindo , refletindo ou ......................{nada a fazer}


Como descre (ver) um fazer radiográfico sobre experiências que ainda não se consumaram.

WorKshop de Aroldo Fernandes, Largo 2 de Julho/ Salvador-Bahia, agosto de 2009. Eu começo falando de um lugar que naturalmente é muito familiar.Dançarina.Meu olhar reflexivo aponta nuances que no decorrer do processo percebo um outro lugar, o de professora e estudante de mestrado em dança.
Cautelosamente e muito zeloso , Aroldo conduz seus estudos de forma consciente e didática, reforçando seus conhecimentos adquiridos em seu voluntário exílio nos EUA aos já existentes aqui em nossa terra brasilis.Indicações e novas informações vão sendo sugeridas. Esse exercício de informações que tem o corpo como meio, sendo resultado desses cruzamentos e não um lugar em que simplesmente as informações são abrigadas, é nada menos que a teoria corpomídia.Uma teoria inteligentemente desenvolvida por Helena Katz e Christine Greiner (2005) e que se torna um aporte teórico atualmente em discussões sobre corpo.
Não tem como se fazer/escrever dança sem um referencial que nos embase cientificamente, pode-se ver isso claramente em todas as produções que participo.Seja numa simples discussão processual, numa escrita, workshop ou até mesmo como espectadora de Um Alemão chamado Severino de Giltanei Amorim.
Colocando-me somente como espectadora, encontrei em Bauman uma referência para explicar esse tempo acelerado e o espaço comprimido, que pude perceber nessa instalação.Não sou crítica de dança, prefiro fazer um exercício de aproximações, claro que o afeto tem seu lugar nessa minha fala, que como artista não destituo minha responsabilidade de curiosa que me move, mas quero salientar que tanto Aroldo como Giltanei(GIL) são exemplos de estudiosos em que não desenvolvem seus estudos de corpo interlocutados com metáforas e analogias como recurso explicativo, mas como equivalência de interações para promover uma contextualização sobre o que chamo de encontro informativo, em que o corpo é pensado correlacionando-se.
Segundo Fabiana Britto “Cada corpo constrói uma dança própria que no entanto, é relativa ao conjunto de conhecimentos disponibilizados em cada circunstância histórica e aos padrões associativos que o corpo desenvolve para estabelecer as suas correlações com o mundo – outros corpos, outras danças, outros conhecimentos” (2008, p. 30).
Como falar, descrever e se pronunciar sem citar tal referencias que são históricas, familiares e profissionais?Fabiana, Aroldo, Helena, Bauman e tantos outros que apesar de discorrem sobre temas comuns outros tantos diversos, se encontram em um ponto comum chamado corpo.
Esse ano, participo, participei e continuo a participar(minha rotina desde os 10 anos de idade) de vários encontros artísticos. Experiências se encontram nesse estado percepção, como a mini-residência que participei de Marcelo Evelin(2009)) e a apresentação no Gamboa Nova, com o Estudo para carne, água e osso(GrupoHIS).Mas para quem não participou o que tem isso em comum, trata-se de mas um devaneio artístico? NÃO.
Marcelo,Adriana, Fabiana, Aroldo, Bauman,Giltanei e outros tantos , assim como Estudo para carne, água e osso, me contaminaram.Deixaram marcas em meu corpo, assim como o filme A lista de Schindler (não sei se é assim que escreve).Engraçado, só lembrando....... como nós ao citarmos um filme em que alguns não conseguem entender simplesmente dizem que não gostam, assim como em dança. Falta um pouco de silêncio na maioria das pessoas , um espaço tempo de reflexão, de escuta.
Pausar, refletir, analisar, onde se encontram esses momentos?Hoje me lembro de duas ocasiões, quando fiz uma aula com Bill T. Jones, ainda como estudante de dança da UFBa, em que ele não falava praticamente nada, se colocava e nós o acompanhávamos, olhando, percebendo, dando continuidade ao seu pensamento e na aula de mestrado aluna de Ivani Santana, querendo ouvir Antrifo Sanches discorrer sobre o capitulo 1- O Mito da formiga-rainha, em Emergência de Steven Johnson.
Bem, voltando à contaminação que aconteceu comigo pelas trocas informativas que foram geradas durante essas ações artísticas (inclusive nas aulas), vale ressaltar na apresentação de Estudo para carne, água e osso em que chego literalmente a um ponto de sufocamento (citação de Sandra Corradini, em Estudo para Carne, água e osso). Nessa apresentação,meu estado de corpo se deteriora, se desfalece e comprime. Uso metáforas para me exprimir,me comunicar, me fazer entender.Uma tentativa correlacional de investigação compositiva.Antonio Damásio discorre muito bem, sobre essa mudança/processo de estado corporal em seu livro O Erro de Descartes.
Todas as experiências colaborativas, partilhando de um lugar comum, outras nem tanto, são capazes de criar procedimentos em relação caráter experimentalista que permeia essas apresentações que participei.Nas experiências cooperativas, sendo algumas sem espaço delimitado e indicações de início e fim, encontro-me ali, em algum lugar, sozinha talvez, porém não construo, nem experimento sem interagir, mas reflito sobre a real necessidade de pausar, refletir,dividir para construir, exercitando nossa presença sobre múltiplos pontos de vista, ou seja como utilizarmos nossa gama de possibilidades tridimensionais.Um exercício constante.
Parece que o exercício de refletir sobre o que está sendo construído/estudado foi se imbricando em meu corpo, como um trabalho continuado que aprendi como instrução, indicação, tornando-se uno como um diálogo afinado e experiente, sabendo o real momento de interagir como instrumento agenciador de informações na produção de conhecimento sobre dança.

Iara Cerqueira
Bailarina, Professora.Mestranda em Dança pelo PPGDança.Diretora do HIS Contemporâneo, Instrutora de Pilates.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRITTO, Fabiana Dultra. Temporalidade em dança: parâmetros para uma história contemporânea.Belo Horizonte: Fabiana Dultra Britto, 2008.
KATZ, Helena Tania. Um, Dois, Três. A dança é o pensamento do corpo.Belo Horizonte: Fabiana Dultra Britto, 2008.
POPPER, Karl R.O cerébro e o pensamento. Campinas, SP: Papirus, 1992.
SANTOS, Boaventura de Souza. Um discurso sobre as ciências.São Paulo: Cortez, 2009

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